sábado, 8 de junho de 2019

Casa | CRÍTICA (8º Olhar de Cinema)


Uma locação quase que universal, Casa é um cenário para reencontros, refeições, brigas e reconciliações não só na ficção, mas como na vida real e para as mulheres da família da cineasta Letícia Simões. A partir de um material resultante de gravações captadas desde 2015 pela própria documentarista, o filme não só é uma tocante composição de sua própria "árvore genealógica" que muito fala sobre a miscigenação brasileira, como é intrínseco ao mostrar as diferentes linhas de pensamento de cada geração.


Ausentando-se de uma composição fotográfica toda demarcada ao preferir uma filmagem tipicamente caseira, acompanhamos Letícia no reencontro de sua mãe, Heliana, e também de sua avó, Carmelita, com quem demonstra ter uma relação mais serena ao contrário das tantas trocas de farpas que vê acontecer entre as suas ascendentes. Munida de uma saudade pela casa onde foi feliz na infância (seria uma referência direta a pergunta que norteia Crônica de um Verão, de Jean Rouch e seu Cinéma Vérité?) e de ímpeto de resgatar arquivos pessoais como as cartas enviadas pela mãe e as antigas fotos da família, a diretora expõe sua humanidade ao ser honesta em exibir os momentos de calmaria e cólera com sua Heliana e também no tratamento predominantemente hostil com que esta aplica a sua mãe de 92 anos – e uma carismática lucidez.

Entretanto, mesmo com essas passagens tão aflitivas (o que me fez lembrar os tantos conflitos que presenciei no meu lado materno da família), Casa é permeado de bom humor. Onde deve prevalecer a harmonia, descobrimos que, em seu lar, Letícia é sempre radiante ao se engajar na revisão dos fatos da (má) educação familiar brasileira e revela que, embora Heliana tanto insista que a filha torne a casar novamente (mais para lhe dar netos), sua mãe é uma pessoa divertida, levando o público a risada sobre uma certa asserção de Maitê Proença sobre a cremação.

Integrante da Mostra Competitiva do 8º Olhar de Cinema, é gratificante ver um documentário tão pessoal assim, provando que a beleza pode ser encontrada mesmo em registros amadores, mas que encontra no gesto de "fazer cinema" uma janela para estímulo de empatia.

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