quinta-feira, 2 de janeiro de 2025

NOSFERATU – a definição de arte nas sombras | CRÍTICA


 

Quando artistas expressam seus desejos em filmar um projeto de tamanha estima, o resultado costuma ser de igual apreço, vide os tantos anos que George Miller dedicou em tirar Mad Max: Estrada da Fúria do papel, muito embora propostas emocionadas como o Megalópolis, de Francis Ford Coppola, não caíram lá no gosto do público. Fazia tempo também que Robert Eggers, um dos nomes mais célebres do terror da última década, há muito desejava fazer sua própria versão de Nosferatu. Nas mãos de quem entregou A Bruxa, O Farol e O Homem do Norte, é como se o conto do horripilante Conde Orlok fosse uma obra inédita tamanha inventividade em expandir o longa de 1922.


Para não estragar surpresas (ainda que a trama não seja mistério algum a considerar seus vários remakes e até as tantas mais versões de Drácula ao longo das décadas), é preciso dizer que Eggers cria uma narrativa pra lá de arrepiante e digna de ficar na beira da poltrona com os desdobramentos da trama – os conflitos emblemáticos da obra centenária estão lá, mas são as adições e a reinterpretação do cineasta que atiçam essa nossa curiosidade. Situada na Alemanha de 1837, a história ganha com o acréscimo de ocultismo, com a tradição cigana e o uso do dialeto dácio (ponto forte do teor horripilante), a entonação pomposa dos diálogos que faz jus ao Romantismo da época, o apelo sexual e até mesmo a adesão da perspectiva/pró-ação feminina que, no fim das contas, faz muito mais sentido do que ter mais um jogo de vilão contra mocinho.

Nicholas Hoult é Thomas Hutter em NOSFERATU
(© Universal Pictures/Focus Features/Divulgação)


Assim como Coppola tinha um dream-team em Drácula de Bram Stoker, o elenco deste Nosferatu é de um magnetismo absurdo. Apesar de que Aaron Taylor-Johnson, Emma Corrin e, em partes, Nicholas Hoult e Lily-Rose Depp sejam relegados a momentos que, em determinado ponto da projeção, se tornam enfadonhos de tantas frases rebuscadas para ações meio redundantes, é fantástico acompanhar Willem Dafoe e Ralph Ineson atuando com gosto entre várias enunciações de histórias sinistras sobre o temível Conde que se aproxima. 


Ralph Ineson, Aaron Taylor-Johnson, Emma Corrin e Willem Dafoe em NOSFERATU
(© Universal Pictures/Focus Features/Divulgação)


E que presença marcante a de Conde Orlok, o Nosferatu. Em uma escolha criativa justa por não mimetizar todos os planos emblemáticos do longa original, aqui, Eggers e Bill Skarsgård (IT - A Coisa) investem em uma performance imperiosa do antagonista, sendo curioso notar que face e até mesmo corpo não são revelados por inteiro num primeiro momento. Conde Orlok é sempre tomado pelas sombras pois o próprio integra as trevas, agora com toda uma ênfase vocal e corporal que o torna muito mais ameaçador, desprezível, nojento e repugnante. 


Lily-Rose Depp e Emma Corrin em NOSFERATU
(© Universal Pictures/Focus Features/Divulgação)


Exercício de goticismo levado a sério (e que nem mesmo Tim Burton conseguiria entregar), desde a  fotografia quase monocromática assinada por Jarin Blaschke e sua destreza de compor cenas noturnas com uma beleza singular, sem se esquecer de mencionar todo o trabalho com sombras, além de todo o trabalho feroz de som que compreende desde efeitos, edição e a trilha sonora de Robin Carolan, Nosferatu diz a que veio e cheio de vigor – e que bom que, exageros à parte, temos Robert Eggers para nos tirar do óbvio.



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