Vinte e sete anos depois de sua estreia no telefilme que se tornou um cult de opiniões divididas, o tenebroso Pennywise não poderia estar em sua melhor e (ainda mais) assustadora forma no remake It: A Coisa, e isso não se deve apenas à possuída performance de Bill Skarsgård como o palhaço saltitante de olhar estrábico e dentes avantajados a ponto de dar coro à coulrofobia. Mais do que um título exclusivamente atrelado ao cinema de horror em sua clara intenção de pregar os mais variados sustos no público, a produção é um excepcional resgate de algo que Stephen King moldou tão bem em sua literatura e que há tempos não se vê nas telonas e muito menos no nosso cotidiano real: o escapismo juvenil que não só resulta nas saudosas brincadeiras de rua com os amigos, como o enfrentamento de cada medo particular pela força coletiva.
Nunca haverá outro verão igual ao de 1990 para os garotos Bill Denbrough (Jaeden Lieberher), Richie Tozier (Finn Wolfhard, de Stranger Things), Eddie Kaspbrak (Jack Dylan Grazer), Stanley Uris (Wyatt Oleff), Ben Hanscom (Jeremy Ray Taylor), Mike Hanlon (Chosen Jacobs) e para a garota Beverly Mash (Sophia Lillis). Moradores da cidade de Derry e constantes alvos de bullying na escola ou por quase todos os lugares por onde passam, a garotada bem que tenta deixar seus medos motivados por seus "defeitos" pessoais em segundo plano, mas quando uma série de aparições assustadoras se manifestam para cada um deles, além dos constantes desaparecimentos de crianças e adolescentes, os ditos integrantes do Clube dos Otários acreditam que, juntos, serão os únicos capazes de investigar quem está por trás de todas essas coisas estranhas e malignas que remontam há muito mais tempo do que eles imaginam.
Dirigindo o elenco juvenil infalível tendo como essência o bucolismo de Conta Comigo e o espírito jovem destemido de Os Goonies, Andrés Muschietti (Mama) acerta em se esquivar da replicação de clichês do terror dos quais tantos diretores ficam tentados em por a qualquer custo na tela (diga-se de passagem, David F. Sandberg e Mike Flanagan) ao prezar pelo desenvolvimento de cada personagem em questão em paralelo com as cenas que arrepiam por sua boa construção cênica e, posteriormente, na montagem com direito a todos os efeitos sonoros e visuais coerentes e sinistros. Todavia um mérito por parte de King e seu tomo de mil páginas, o roteiro que envolve a assinatura de Cary Fukunaga (Beasts Of No Nation, True Detective) não tem receios em tomar boa parte da narrativa ao explorar cada personagem – por mais que retarde o ritmo além do necessário ao investir nas sequências de investigação – em troca de uma maior empatia com o espectador adulto que, por sua vez, vai se encontrar com seu passado além das referências expostas no cinema da cidade ou nas piadinhas com New Kids On The Block, a boy-band de sucesso daquele ano. É curioso notar também que muitas das cenas de terror propriamente ditas se passam ou durante dias ensolarados ou em locações internas com incidência de luz e isso não ameniza em nada a sensação de medo.
Meticuloso em suas composições visuais e nos cortes cirúrgicos da edição que fazem cada susto valer a pena, sem se esquecer de mencionar a plasticidade do cenário com as pessoas flutuantes, dizer que It se posiciona como um dos melhores filmes de terror de 2017 pode soar arbitrário, principalmente se for levar em conta que há mais aventura nele do que a quantidade de planos violentos e de sangue moderado prenunciados na primeira e icônica sequência de abertura. De qualquer forma, levando em consideração as adaptações de A Torre Negra e a série O Nevoeiro, o filme se prova como uma das melhores adaptações de um livro de Stephen King em anos (ou seria da última década?) e é intrínseco no retrato do medo da geração dos personagens e suas posteriores: da perda natural da inocência a partir das novas experiências, o medo de envelhecer e chegar à uma vida adulta apática e sem graça (tal como os adultos em cena) é maior do que enfrentar um palhaço no esgoto ou qualquer outra coisa que Pennywise quiser se transformar.
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