sábado, 18 de janeiro de 2025

CONCLAVE – um tremendo suspense de batina | CRÍTICA

 Ralph Fiennes em CONCLAVE


Nos últimos vinte anos, o mundo pôde acompanhar a eleição de dois novos papas e todas as cerimônias que circundam esse processo que recai toda a atenção perante a Igreja Católica, que muito parece gostar disso em tempos nos quais a doutrina vem perdendo fieis para outras doutrinas neopentecostais que usam e abusam da positividade tóxica e da roupagem freestyle em suas deturpações do mito da Caverna de Platão. Para a Igreja em si, é também um tempo de renovação de votos, ou melhor, de como vai comandar sua influência tendo um novo líder político e o que seus direcionamentos hão de lidar com isso. Após o ótimo Habemus Papam (2011), de Nani Moretti, chegou a hora de mais um confinamento cardeal com Conclave, que surpreende com a sua condução ao lado de um texto afiado.


Dirigido por Edward Berger, que nos levou à loucura completa das trincheiras alemãs com Nada de Novo No Front (2022), o filme que adapta o livro escrito por Robert Harris se faz praticamente da mesma forma que um thriller de guerra. Trocam-se os uniformes fardados por batinas. Dos burburinhos, irrompe uma batalha interna entre ideologias formadas por cardeais de diferentes nacionalidades e/ou ordens, querendo promover maior abertura de pensamento a fim de trazer novos fieis enquanto outras correntes prezam por um "papa raiz", clamando por um sumo pontífice terrivelmente italiano e uma tendência conservadora. Cabe ao decano Lawrence (Ralph Fiennes), apesar de todo o abalo do luto e o cansaço que vem se queixando, coordenar o conclave a acontecer por dias na Capela Sistina, mas até que ponto o cardeal fará a ponte diplomática entre os favoritos enquanto precisa conter as possíveis influências do mundo externo?

John Lithgow em CONCLAVE
(Diamond Films/Divulgação)


Desde seus primeiros minutos, Conclave tem um magnetismo que chega a ser difícil de se desprender. Se a trilha potente já prenuncia uma bomba-relógio que até parecia se inclinar para um sensacionalismo brega tipo Dan Brown, o ótimo elenco, que também traz Stanley Tucci, John Lithgow e Isabella Rossellini, e a mise-en-scène ativa de Berger nos conduzem pelos interiores do Vaticano com um texto afiado, repleto de segredos que gritam para ser revelados tornando o decano em detetive em suas indagações sobre os últimos atos do papa falecido. Entre as refeições bem nutridas (feitas por irmãs) e conversas nas escadarias, a busca por um nome ideal começa antes do turno de confinamento.


Isabella Rossellini em CONCLAVE
(Diamond Films/Divulgação)


Há em Conclave a ressalva do uso recorrente da exposição, isto é, quando personagens se dedicam a explicar verbalmente fatos correndo o risco de tornar a narrativa muito didática. Berger, porém, já se mostrou um cineasta nada preguiçoso e aproveita essas explicações para injetar ainda mais atenção para a narrativa ao mover seu elenco de forma que acompanhar essa movimentação ou até mesmo em dedicar interesse em devidos personagens iluminando-os enquanto mantidos em uma certa posição torna todo o quadro mais inteligente mesmo em planos gerais. É um negócio chique demais.


(Diamond Films/Divulgação)


Surpresa cinematográfica que torço para que não seja um título frívolo a ser esquecido em tão pouco tempo, mesmo com alguns excessos ocasionais, Conclave já entra naquele grupo especial de obras que a gente já separa para indicar aos familiares que pedem por um filme diferente, mas que seja fácil de entender. Para além disso, é um entretenimento reflexivo que lembra que isso tudo não foi feito só de fé.



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