segunda-feira, 13 de janeiro de 2025

MARIA CALLAS – estátuas que desmoronam | CRÍTICA

 Angelina Jolie em MARIA CALLAS


Há algo de fascinante nas cinebiografias dirigidas por Pablo Larraín, diretor por trás de títulos biográficos como Spencer Jackie (isso sem se esquecer da bomba recente O Conde). Tudo é filmado com elegância, com uma condução que esbanja sobriedade em seu retrato de passados melancólicos, deixando o espectador cada vez mais hipnotizado em querer descobrir sobre aquelas pessoas de aparências tão glamurosas, porém, como vem a se descobrir, escondem almas melancólicas. Encerrando, então, esta trilogia informal de grandes mulheres do Século XX, é com Maria Callas que Larraín se prova um enxadrista ao utilizar o melhor da linguagem cinematográfica para recontar uma história de vida memorável ainda que se entregue pouco emocionante.


O ditado não falha: quem vê cara, não vê coração. O início de Maria (título original) se faz uma montagem de grandes momentos da diva da ópera, alçando a cantora no mesmo nível das figuras épicas retratadas nas árias dos concertos lotados, glorificada pelos flashes das câmeras de fotógrafos nas ruas. Sua vida pessoal, entretanto, é tomada como uma ruína. Solitária, hipocondríaca e saudosista pelo conforto do estrelato, a Maria Callas representada por Angelina Jolie segue por dias tristes em sua luta por retornar aos palcos apesar de sua voz já não ter a mesma potência de outrora. O marasmo incomoda Maria – a posição do piano na sala nunca está ao seu agrado, para a infelicidade da coluna de seu mordomo (Pierfrancesco Favino) e da governanta (Alba Rohrwacher), que se preocupam veemente com a condição de saúde da cantora, progressivamente perdida em devaneios.

Alba Rohrwacher, Pierfrancesco Favino e Angelina Jolie em MARIA CALLAS
(© Diamond Films/Divulgação)

Devaneios esses que permitem Larraín de explorar a metalinguagem e, assim, criar um filme dentro de um filme, como se Callas contratasse uma equipe de filmagem ao passo em que diz escrever sua própria biografia. O diretor contratado (Kodi Smit-McPhee) é provocativo, quer investigar o passado da diva por caminhos que lhes serão tortuosos – e essa é a deixa para que o diretor, o roteirista Steven Knight (Spencer, Peaky Blinders) nos conduzam por lembranças que, todavia tristes em partes, se tornam magistrais pelas lentes e cores do diretor de fotografia Ed Lachman (O CondeCarol) que, de fato, faz um retrato de época tão verossímil que, no fim das contas, parece até um documentário.

Kodi Smit-McPhee e Angelina Jolie em MARIA CALLAS
(© Diamond Films/Divulgação)


Neste conto alinear que sempre vai despertando a curiosidade pela protagonista – a ponto de mal esperar terminar a sessão e pesquisar mais detalhes sobre a vida da mesma (curiosamente, senti o mesmo quando vi Jackie e até mesmo Spencer) –, logicamente, o peso recai sobre a atuação de Angelina Jolie, que surpreende pelo fato de ter aprendido a cantar ópera especialmente para o papel e entrega performances vocais surpreendentes, fato que deve ter lhe favorecido no prêmio de Melhor Atriz no Festival de Veneza, muito porque sua contraparte dramática, talvez oscilada pela não-linearidade da montagem, culmina mais em uma sucessão de planos de face lânguida e outras poses sofridas como a Isabela Boscov ficou famosa por reclamar em suas considerações.


Angelina Jolie em MARIA CALLAS
(© Diamond Films/Divulgação)


Filme chique e bonito de contemplar bem característico das salas de cinema VIP e do circuito alternativo, além de se conectar indiretamente com a trama de Jackie, Maria Callas se faz um convite para adentrar em uma sala e admirar uma preciosidade de uma antiguidade recente e que gerações recentes possivelmente desdenharão seu interesse a respeito, mas, apesar de uma personalidade retratada em quase desmoronamento feito as tantas estátuas gregas presenteadas pelo magnata Aristóteles Onassi acumuladas no apartamento de Callas, vale toda a apreciação.




Nenhum comentário:

Postar um comentário

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.