quinta-feira, 24 de novembro de 2016

A Chegada | CRÍTICA


Ver um filme dirigido por Denis Villeneuve passou a ser referência de uma ótima experiência cinematográfica tendo em vista o igualmente ótimo senso imagético do diretor canadense e sua habilidade de conduzir narrativas aplicando o suspense com uma sutileza rara ao evitar artifícios sensacionalistas. O anúncio de que A Chegada, seu primeiro passo na ficção-científica, seria lançado por um grande estúdio dava a entender que a obra ficaria refém das convenções típicas de um blockbuster do gênero, mas Villeneuve mostra, novamente, porque é um dos diretores autorais mais proeminentes da última década.


Doze colossais naves côncavas flutuam em específicos pontos do planeta, colocando a Humanidade em alerta sobre os alienígenas de conduta ainda duvidosa. De onde vieram? Que forma têm? O que estão falando? Perguntas que o governo dos Estados Unidos estende diante da Dra. Louise Banks (Amy Adams), uma linguista acadêmica que já havia cooperado no passado com a CIA, contando agora com o apoio do físico Ian Donnelly (Jeremy Renner). O contato da dupla de especialistas com os heptapods é feita sem rodeios, apesar das diferenças claras de comunicação, e assim tentam desvendar a ruidosa língua extraterrestre e sua escrita cíclica, exigindo mais da capacidade de Banks enquanto líderes mundiais anseiam por conflitos armados contra os invasores cujas intenções parecem divergir no entendimento de cada tradutor ao redor do mundo.



Inspirado no conto "Story Of Your Life" de Ted Chiang, o roteiro de Eric Heisserer (Quando As Luzes Se Apagam) é mais uma experiência intimista do que uma defasada batalha típica de um Independence Day, o que é um grande alívio. Ao explicar os avanços da acadêmica sem tanta exposição (apesar de recorrer a elipses quando os padrões se tornam mais complexos), o contexto de A Chegada não poderia ser menos contemporâneo, ainda mais quando a interpretação verbal é diariamente levada a extremos sem pensar nas consequências do uso das palavras abordadas, tal qual o exemplo em cena onde dois militares se inspiram no discurso reacionário de um vlogger e tratam de incendiar a situação para assim vilanizar os heptapods. Seja nos Estados Unidos, na China ou em qualquer lugar do mundo e em qualquer período da História, as falhas (ou seria a falta?) de comunicação sempre foram a maior inimiga da Humanidade.

Mas um excelente sci-fi não se faz apenas com uma boa história e Villeneuve se mostra rodeado de parceiros igualmente competentes. O diretor de fotografia Bradford Young (Selma, O Ano Mais Violento) enquadra os cenários e locações com um relativo afastamento em meio a uma sublime melancolia refletida nas cores do céu ou dos ambientes por onde passa, uma veneração diante do desconhecido que se aproxima gradativamente ao desenrolar da trama. Retomando a parceria com o diretor depois de Sicario, o islandês Jóhann Jóhannsson entrega uma trilha sonora mínima, mas retumbante, prevalecendo notas de mistério que dificilmente entregam o posicionamento dos heptapods perante a humanidade. Uma pena mesmo que os efeitos visuais se portem com uma descuidada artificialidade em alguns momentos, a julgar pelo flutuante cabelo da linguista durante uma cena dentro da nave.

Sem deixar de mencionar a montagem eficiente de Joe Walker, apresentando apenas o que é favorável à história, A Chegada (Arrival) é surpreendente no que tange à articulação de narrativa, iludindo o espectador de forma positiva ao entregar uma das reviravoltas mais fascinantes do cinema de 2016 (quem sabe, da última década), ainda mais quando os trailers e a boa performance de Amy Adams nos levavam a crer que tudo ali seguiria cronologicamente de A a Z. Todavia, ao lembrar de que se trata de uma direção de Denis Villeneuve, nem tudo é o que parece ser a uma primeira instância e, assim como em seu igualmente ótimo Incêndios, nem sempre "um mais um" será igual a dois. Se inícios e finais aqui podem se convergir, fica a certeza de que Blade Runner 2049 tem grandes chances de ser magnífico.




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