quinta-feira, 10 de novembro de 2016

Pequeno Segredo | CRÍTICA


O plano de abertura de Pequeno Segredo revela a imensidão do mar, um cenário mais do que conhecido da família Schurmann, conhecida por fazer voltas pelo mundo através dos oceanos há décadas. Mas, diferente do esperado, no caso, mais um documentário sobre as jornadas marítimas dos catarinenses, desta vez David Schurmann enxerga no livro assinado pela própria mãe um material comovente o bastante para se lançar de vez na dramaturgia cinematográfica, mas é em sua execução, tão presa ao lugar-comum da linguagem audiovisual, que o filme se mostra aquém de alcançar a marca de um divisor de águas no cinema brasileiro.


Com um roteiro escrito a seis mãos, incluindo a do próprio diretor, Pequeno Segredo apresenta o elo afetivo entre Heloisa Schurmann (vivida por Júlia Lemmertz) e sua filha mais nova, Kat (Mariana Goulart). Assim como os outros irmãos (raramente mencionados), a menina segue uma rotina entre uma vida no mar e outra no solo de Florianópolis, incluindo as passagens de sua desconfortável transição para a adolescência que culminam em anotações em seu diário secreto. Como mãe, Heloisa procura entender os sentimentos da filha e Schurmann filho/diretor trata de mostrar o quão atenciosos seus pais, por mais que Vilfredo (numa interpretação quase decorativa de Marcello Antony) esteja mais conectado ao seu barco. Se a menina, tão magrinha, procura manter seus sentimentos guardados, Heloisa também mantém os seus na espera da hora certa para dividi-los e, até lá, o filme vai do Pará à Nova Zelândia para contar paralelamente como tudo veio aportar ali no Sul do país.



Da sua trilha melodramática ao tratamento fotográfico que esbanja tomadas aéreas nas suas locações remotas, a produção da Schurmann Films não economiza em sua tentativa de criar um filme bonito, emotivo, mas o roteiro e a direção automática impedem que haja um desenvolvimento que o torne propriamente distinto, ainda mais quando não faltam exemplos de filmes que abordam a mesma doença retratada. É verdade que Lemmertz, Maria Flor e até o neozelandês Erroll Shand fazem o possível para que a história mantenha seu devido potencial dramático, mas boa parte dos conflitos e suas resoluções flertam com a estereotipagem, vide a avó malvada (Fionulla Flanagan, quase uma sósia da Ellen Burstyn), ou em cenas que pecam por seus excessos visuais, como o caso da baleia digital que Jeanne (Flor) vem a interagir numa praia.



Embora a mensagem sobre adoção, bullying e amparo aos enfermos tenha uma relevância atemporal, e que seja interessante também ver o cinema catarinense lançar um filme de apelo popular (ao contrário do comportamento blasé de boa parte dos cineastas do Paraná), o velho estilo televisivo – aquele de closes e do esquema de planos/contra-planos – ainda é dominante na produção, algo que, de tão repetitivo, nos distancia mais e mais da produção, assim como deixa a decisão do Ministério da Cultura em xeque.

Encalhando nos clichês melodramáticos, acaba que Pequeno Segredo é um retrato particular ficcionalizado carente de uma  maior visão do mundo ou, quem sabe, do seu próprio país. 





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