quinta-feira, 10 de novembro de 2016

Quando o Dia Chegar | CRÍTICA


O discurso ufanista do presidente J.F. Kennedy e a famigerada corrida espacial muito provavelmente influenciaram uma geração de garotos crescidos na década de 1960, procurando um modelo para se espelhar enquanto suas casas e escolas insistiam na nada-amigável educação passível de castigos físicos. Sonhar em ser astronauta quando crescer era, então, um anseio de liberdade do qual dificilmente alcançariam, embora nada seja impossível para a imaginação. Em sua retratação da perda da inocência, Quando o Dia Chegar não se esquece de repreender os abusos que deixam marcas para o resto da vida.

Elmer (Harald Kaiser Hermann) e Erik (Albert Rudbeck Lindhardt) são dois irmãos filhos de uma mãe viúva que faz o possível para o sustento da família após o suicídio do marido em uma Copenhague ainda desigual, pagando menos pela mesma função que exerce numa fábrica. Uma doença pulmonar impede a mãe dos garotos de trabalhar e, desse modo, igualmente não pode cuidar dos filhos pré-adolescentes e é obrigada a acatar a decisão do conselho tutelar em levá-los para um reformatório no interior do país, ainda mais quando a soma de pequenos delitos praticados pelos dois dá motivos para isso. Dentro de Gudbjerg, Erik e Elmer aprendem que não há tolerância para desacatos, conversas fora de hora e prantos, submissos a visão estreita da instituição que acredita que castigos e violência são a única forma de vencer a "delinquência" juvenil.


Com um dedo em riste apontando denúncias sem cutucá-las a fundo, Jesper W. Nielsen dirige o roteiro de Søren Sveistrup construído a partir de alguns casos verídicos sobre violência e abuso sexual nos reformatórios enquanto retrata a capital da Dinamarca sempre ensolarada e com bastante atividade jovem em seus movimentos culturais e deixando o inglês soar numa canção de verão. Já na inóspita Gudbjerg, Nielsen aproveita o semblante gélido do competente Lars Mikkelsen (o irredutível presidente Petrov de House Of Cards) a ponto de tornar seu diretor Heck um homem cuja cólera é imensurável quando provocado, mas é a compaixão magnética da professora vivida por Sofie Gråbøl que movimenta o filme e torna tudo mais interessante.


Flertando com as "magníficas" imagens da chegada do homem (estadunidense) à Lua, o que resulta numa saudosa composição de uma caixa d'água no campo e o satélite natural brilhando no céu, os bons momentos de alteridade entre os garotos de Quando o Dia Chegar (Der Kommer en Dag) fazem do filme uma espécie de Oliver Twist dinamarquês contrapondo o patriarcado que, mesmo décadas depois, se posiciona de forma relutante.



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