De uma crise das infinitas terras cinematográficas que a DC passou na última década, tentando bater de frente com o Marvel Studios anunciando mais projetos do que efetivamente realizando-os com rara eficiência, foi preciso acatar de vez o desgaste até mesmo externo para que o novo DC Studios co-capitaneado por James Gunn (que fez muita fama por sua trilogia de Guardiões da Galáxia) entendesse todo o cenário para conduzir os super-heróis do selo a um lugar mais favorável ao sol. Auto-consciente das ressalvas da era passada e de um público carente de otimismo, agora, Superman abraça a tarefa de agradar tudo e a todos a fim de ninguém botar defeito.
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(© Warner Bros. Entertainment Inc./Divulgação) |
Para quem esperava o retorno de um Superman que salva sorvete de criancinha ou qualquer traço inocente tão visto nos clássicos (não tão bons) de 1978 ou 1980, este filme reverte a mão pesada da temática socioexistencialista da era Nolan/Snyder apresentando um protagonista muito mais compassível, o que não quer dizer que não vá abordar (meio que sem querer querendo) temas mais contundentes a realidade atual: a perversidade profunda dos bilionários das big techs, as políticas externas frágeis, os consecutivos genocídios financiados pelos EUA para criarem oásis turísticos, a toxicidade das redes sociais e a sua onda de hate tornada uma kryptonita tão mordaz quanto a esverdeada. Este novo Clark Kent não tem nada de isentão, apesar de que o cineasta faz questão de agradar esse público saudosista inserindo a versão repaginada do tema musical assinado por John Williams a ponto da exaustão.
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(© Warner Bros. Entertainment Inc./Divulgação) |
Em se tratando de agrado, é reconfortante testemunhar um elenco principal tão bom e afiado que, bastam alguns minutos para eleger Rachel Brosnaham (série The Marvelous Mrs. Maisel) e Nicholas Hoult (Nosferatu) como as versões definitivas de Lois Lane e Lex Luthor, respectivamente, ainda mais depois que o vilão nunca teve uma representação tão maligna e aguçada ao seu material base quanto agora. E, se David Corenswet já tem tudo para ser o Superman favorito desta geração com muita facilidade, é válido apontar o acerto recorrente de James Gunn em resgatar personagens que jamais imaginávamos dar atenção despontando com igual carisma às estrelas principais. O Sr. Incrível de Edi Gathegi (X-Men: Primeira Classe) se torna um personagem jocoso de acompanhar, por mais que Gunn recicle várias ideias dos Guardiões da Galáxia e, mais uma vez, vemos capangas sendo facilmente derrotados ao som diegético de uma música de tiozão, entre outros detalhes similares, desde o tratamento de personagens femininas (o clichê da "loira burra" é de doer de tão incômodo) a um flerte com um certo destruction porn das incursões anteriores do Superman, que nunca apanhou tanto quanto agora. Reflexo de um cinemão que demanda grandes elementos para concentrar atenção?
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(© Warner Bros. Entertainment Inc./Divulgação) |
Marcas indeléveis do cineasta (até porque já havia acontecido em O Esquadrão Suicida), é curioso apontar como Gunn ainda consegue trazer novidades até mesmo ao próprio estilo ao injetar mais escala na ação e até mesmo desenhá-la de forma cartunesca – e não só pelo sagaz adendo do cãozinho Krypto que também é um acerto em cheio. As cores da fotografia são vivas e os movimentos de câmera tornam tudo mais dinâmico, sobretudo pela movimentação de heróis e vilões onde a energia de piruetas em voos e golpes impera que é muito prazeroso de ver esses momentos.
Talvez pudesse ser mais revolucionário e até desprendido dos cacoetes de seu cineasta, afora seu clímax um tanto ameno, o filme é um bom título de reentrada logo quando se amontoa de responsabilidades e ambições de puxar a soberania do gênero para o seu estúdio. A se considerar essa temível era da pós-verdade em que estamos submetidos, Superman convém a ser, no fim das contas, um ótimo recado de que a esperança prevalece estimando a união e a inteligência acima do ódio e da força bruta.
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