sexta-feira, 18 de julho de 2025

A MELHOR MÃE DO MUNDO – neorrealismos brasileiros | CRÍTICA

 

Seu Jorge e Shirley Cruz em A MELHOR MÃE DO MUNDO

É um feito admirável que Anna Muylaert tenha se tornado uma das cineastas brasileiras mais prolíficas na última década, ainda que a alçada dada com Que Horas Ela Volta? fez com que toda a comunidade cinéfila – e de militantes progressistas – tenham concentrado a sua atenção na diretora e roteirista que, a cada novo título, procura trazer temas contundentes sobretudo quanto à figura feminina na contemporaneidade, por vezes e motivos, sufocantes. É com esmero que Muylaert apresenta A Melhor Mãe do Mundo com um diálogo afável mesmo lidando com tantas camadas problemáticas.


Protagonizado por Shirley Cruz, é interessante como o longa se desdobra em ser mais do que um conto sobre violência doméstica, mas uma abordagem plural do que parece circundar a mulher periférica: catadora de materiais recicláveis pelas ruas de São Paulo, Gal (Cruz) não se permite sentir o pesar da agressão do namorado (Seu Jorge) porque é ela que precisa dar sustento para suas duas crianças (Rihanna Barbosa e Benin Ayo, ótimos!) mesmo com o pouco que recebe diariamente. Passo a passo, tornamo-nos cúmplice de Maria da Graça tamanha sua resiliência e sorriso no rosto porque sabe que é impossível desistir, mesmo que seja para ter muito pouco.


Shirley Cruz (centro) e as crianças Rihanna Barbosa (esquerda) e Benin Ayo (direita) em A MELHOR MÃE DO MUNDO
(© Galeria Distribuidora/Divulgação)

Na decupagem econômica de Muylaert, também enxergamos o suficiente para denotar o caos consumista: o tanto de embalagens industriais e o desperdício de alimentos misturados de qualquer jeito nos tantos sacos de lixos que essas mulheres em que luxo e vaidade lhes são coisas praticamente desconhecidas, a desolação dos bairros centrais paulistanos, a insalubridade dos serviços informais, o alcoolismo como catalisador de tantos males familiares. Desta vez, a luta de classes dá a vez para uma guerra interna, mas e quando o único recurso parece ser a trégua em prol da sobrevivência?


Com tantas aberturas para reflexões sociais e uma maravilhosa sinergia entre mãe e filhos, acaba que toda a resolução da violência doméstica é uma das partes menos interessantes do filme, embora seu desfecho tenha lá uma articulação intrigante. Concentrada no neorrealismo, Muylaert permite a sua Gal confabular uma aventura incrível para a família e até mesmo uma coincidência pode alçar a magia que vem da busca por alegria.




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