domingo, 29 de abril de 2018

Teu Mundo Não Cabe Nos Meus Olhos | CRÍTICA


Em uma época em que boa parte da sociedade se vê receptiva para todos os tipos de inclusão, em tese, Teu Mundo Não Cabe Nos Meus Olhos faz parte de um belo movimento de levar as pessoas com deficiências visuais para as salas de cinema tal como Hoje Eu Quero Voltar Sozinho fizera há alguns anos, podendo apreciar a obra com direito a audiodescrição além de sua narrativa originalmente em português. O resultado, porém, é um acúmulo de ressalvas que compromete seriamente o exercício de empatia.

Escrito e dirigido por Paulo Nascimento, o filme apresenta Vitório (Edson Celulari), um pizzaiolo que nunca viu problema em sua cegueira ocorrida naturalmente ainda na infância. Pelo contrário, Vitório acredita que é a falta de visão que lhe dá um sentido especial de preparar a melhor massa e molho de pizza da cidade (ou, pelo menos, do bairro Bixiga) e até mesmo ver as qualidades interiores das pessoas ao seu redor. Se quem não vê cara, vê coração, a vida familiar de Vitório parece em harmonia para ele, mas o que ele não enxerga é que sua esposa, Clarice (Soledad Villamil, de O Segredo dos Seus Olhos), e sua filha (Giovanna Echeverria) também possuem desejos particulares que, por vezes, foram suprimidos pelas necessidades do patriarca. No entanto, quando há uma possibilidade cirúrgica de Vitório poder enxergar, todos ao seu redor – e, inclusive, o simpático garçom gaúcho Cleomar (Leonardo Machado, divertido!) – estimam uma nova vida para o homem que, ironicamente, se encontra relutante em ver as coisas como elas realmente são.


Claudicante por suas ações encenadas com uma direção pra lá de mambembe, sendo uma cena de assalto a pior de todas a julgar por seu texto farsesco e decupagem de câmeras trêmulas, o filme não contribui para o sentimento de alteridade das personagens cujo elenco faz de tudo para a situação ser bastante crível, ainda que seu núcleo argentino seja mais um luxo de produção do que uma necessidade narrativa. Chega a ser decepcionante atestar que o habitualmente carismático Edson Celulari surja como um homem apático por ser ríspido diversas vezes com o seu funcionário e no tratamento frio que tem com a filha e com a esposa, esta vítima de uma péssima sugestão de um triângulo amoroso com o médico vivido por Roberto Birindelli que só fica nas indiretas.

Ainda fosse um ensaio sobre a liberdade de ação dos portadores de necessidades especiais, Teu Mundo Não Cabe Nos Meus Olhos deixa a desejar também ao possuir um tratamento sonoro tão óbvio, logo quando poderia ao menos se espelhar no que foi feito em Ensaio Sobre A Cegueira ou estipular uma identidade sonora própria. Por fim, só fica a vontade de que existisse também um procedimento para "desver" essa produção de tantos deméritos.




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