De seus títulos mais conhecidos, a filmografia de Thomas Vinterberg se resume a produções com dramas intensos envolvendo um considerável número de personagens motivados por um conflito particular que poderá ser solucionado pela boa vontade do coletivo ou não. A Comunidade (Kollektivet) não poderia ser menos diferente e, mais uma vez, o diretor dinamarquês entrega um filme cativante que emociona em vários aspectos ao focar no ímpeto por mudanças de uma família, redescobrindo as consequências do que é novo aos olhos e ao coração.
Para qualquer cidadão de Copenhague, Erik (Ulrich Thomsen), um professor universitário, Anna (Trine Dyrholm, uma Meryl Streep dinamarquesa), âncora de um telejornal, e sua filha Freja (Martha Sofie Wallstrøm Hansen) parecem uma família comum e até os mesmos parecem acreditar nisso. Quando Erik recebe de herança um casarão de 450m² e estão quase prontos para se mudar para o novo lar, ainda que receosos quanto ao custo de manutenção do lugar, Anna tenta convencer o marido de habitar o lugar dividindo-o com outras pessoas, desde que sejam de confiança deles. Para a jornalista, é a oportunidade perfeita para renovar a relação do casal e trazer mais alegria e outras vozes ao ambiente tão quieto; para Erik, meio avesso à proposta da criação da comuna, mas ciente da colaboração financeira, parecerá o fim de uma vida privativa e outra em busca de seus próprios interesses, que podem abalar as estruturas daquela nova e grande família.
Em um cenário propenso a ter um ar novelesco, o tratamento de Vinterberg para o seu roteiro co-escrito por Tobias Lindholm (A Caça) vai por outro lado e se mostra tanto dinâmico como observativo, utilizando elipses para apresentar as características marcantes de cada novo morador sem delongas, mostrando as razões pelas quais cada pessoa ali será essencial para a criação da comuna, até mesmo o sensível Allon (Fares Fares) que pouco acrescenta no todo e ainda será motivo de desprezo por parte do radical Ole (Lars Ranthen). Do clima alegre elevado pela trilha nostálgica e demais elementos em cena, enaltecidos pela bela fotografia de Jesper Tøffner, que não se intimida com o clima úmido e nublado da cidade, a primeira parcela do filme se projeta de forma prazerosa, uma descoberta divertida regrada a mesas de jantar fartas que terminam em cigarros e cervejas, além de bons diálogos entre aqueles moradores. É como se, pouco a pouco, também nos tornamos moradores da comuna, sorrindo e chorando com o que passa por ali.
Apesar do grande elenco, a verdade é que a todo o momento estamos acompanhando os pontos de vista daquele trio que começou essa história. Debaixo de seus cachos ruivos e de sua personalidade enigmática, Freja esconde sua efervescência adolescente para descobrir o sexo, mas é impressionante o trabalho da dupla Thomsen e Dyrholm (retornando a parceria com o diretor desde o dogmático Festa de Família), que aos poucos vai rompendo com a cumplicidade que o casal detinha entre si. De um carismático acadêmico de arquitetura, onde busca projetar coisas grandiloquentes, Erik vai se portanto como um sujeito áspero e incapaz de retomar a harmonia da sua família, buscando consolo em sua amante, décadas mais jovem. Por sua vez, a energia radiante que circunda a personagem de Trina Dyrholm dá a vez para uma aura sombria, definhando-se ao perceber a ação do tempo no rosto quando é maquiada no estúdio, onde também tem a informação de que trabalha há muitos anos e, pouco a pouco, vai se deixando abater pelas tristes notícias do mundo afora. Mesmo quando procura dar uma segunda chance para o marido, suas manobras resultam em consequências mais angustiantes.
A Comunidade é daquele tipo de filme que parece ironizar a procura da resolução dos problemas pessoais abrindo-os para o mundo, convencendo por suas ótimas atuações pontuais, mas falta ousadia em seu senso de alteridade. Considerando a proposta de coletivismo, além do cenário pró-libertário (de corpo, alma e pensamento) advindo da primeira metade dos anos 70, o longa por vezes demonstra um paternalismo conservador, fazendo pouco caso dos distintos coadjuvantes que integram a comuna. É a partir das informações pessimistas ao final do noticiário e as falsas esperanças que podem ser até mortais que percebemos que nem sempre o mundo nos entrega as coisas do jeito como bem desejamos.
Para qualquer cidadão de Copenhague, Erik (Ulrich Thomsen), um professor universitário, Anna (Trine Dyrholm, uma Meryl Streep dinamarquesa), âncora de um telejornal, e sua filha Freja (Martha Sofie Wallstrøm Hansen) parecem uma família comum e até os mesmos parecem acreditar nisso. Quando Erik recebe de herança um casarão de 450m² e estão quase prontos para se mudar para o novo lar, ainda que receosos quanto ao custo de manutenção do lugar, Anna tenta convencer o marido de habitar o lugar dividindo-o com outras pessoas, desde que sejam de confiança deles. Para a jornalista, é a oportunidade perfeita para renovar a relação do casal e trazer mais alegria e outras vozes ao ambiente tão quieto; para Erik, meio avesso à proposta da criação da comuna, mas ciente da colaboração financeira, parecerá o fim de uma vida privativa e outra em busca de seus próprios interesses, que podem abalar as estruturas daquela nova e grande família.
Em um cenário propenso a ter um ar novelesco, o tratamento de Vinterberg para o seu roteiro co-escrito por Tobias Lindholm (A Caça) vai por outro lado e se mostra tanto dinâmico como observativo, utilizando elipses para apresentar as características marcantes de cada novo morador sem delongas, mostrando as razões pelas quais cada pessoa ali será essencial para a criação da comuna, até mesmo o sensível Allon (Fares Fares) que pouco acrescenta no todo e ainda será motivo de desprezo por parte do radical Ole (Lars Ranthen). Do clima alegre elevado pela trilha nostálgica e demais elementos em cena, enaltecidos pela bela fotografia de Jesper Tøffner, que não se intimida com o clima úmido e nublado da cidade, a primeira parcela do filme se projeta de forma prazerosa, uma descoberta divertida regrada a mesas de jantar fartas que terminam em cigarros e cervejas, além de bons diálogos entre aqueles moradores. É como se, pouco a pouco, também nos tornamos moradores da comuna, sorrindo e chorando com o que passa por ali.
Apesar do grande elenco, a verdade é que a todo o momento estamos acompanhando os pontos de vista daquele trio que começou essa história. Debaixo de seus cachos ruivos e de sua personalidade enigmática, Freja esconde sua efervescência adolescente para descobrir o sexo, mas é impressionante o trabalho da dupla Thomsen e Dyrholm (retornando a parceria com o diretor desde o dogmático Festa de Família), que aos poucos vai rompendo com a cumplicidade que o casal detinha entre si. De um carismático acadêmico de arquitetura, onde busca projetar coisas grandiloquentes, Erik vai se portanto como um sujeito áspero e incapaz de retomar a harmonia da sua família, buscando consolo em sua amante, décadas mais jovem. Por sua vez, a energia radiante que circunda a personagem de Trina Dyrholm dá a vez para uma aura sombria, definhando-se ao perceber a ação do tempo no rosto quando é maquiada no estúdio, onde também tem a informação de que trabalha há muitos anos e, pouco a pouco, vai se deixando abater pelas tristes notícias do mundo afora. Mesmo quando procura dar uma segunda chance para o marido, suas manobras resultam em consequências mais angustiantes.
A Comunidade é daquele tipo de filme que parece ironizar a procura da resolução dos problemas pessoais abrindo-os para o mundo, convencendo por suas ótimas atuações pontuais, mas falta ousadia em seu senso de alteridade. Considerando a proposta de coletivismo, além do cenário pró-libertário (de corpo, alma e pensamento) advindo da primeira metade dos anos 70, o longa por vezes demonstra um paternalismo conservador, fazendo pouco caso dos distintos coadjuvantes que integram a comuna. É a partir das informações pessimistas ao final do noticiário e as falsas esperanças que podem ser até mortais que percebemos que nem sempre o mundo nos entrega as coisas do jeito como bem desejamos.
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