terça-feira, 23 de novembro de 2021

ENCANTO – fazendo a magia perdurar | CRÍTICA


Teria sido na Colômbia o berço do chamado "realismo mágico" e de tantos artistas da literatura e da música pop, mas o 60º longa-metragem de animação da Disney, por ora, não se dedica a adaptar uma obra de Gabriel García Marquez ou repetir a parceria com Shakira depois de Zootopia. Na vontade de fazer um filme sobre a América Latina, os realizadores Byron Howard, Jared Bush e a co-diretora Charise Castro Smith encontraram nas belezas naturais e na mitologia própria do país todo o clima e o mote necessários para Encanto, que só tende as expandir os méritos narrativos e artísticos do estúdio.


A aura do filme tem muito do que Viva - A Vida É Uma Festa, Moana e Frozen já vinham trabalhando há tempos na questão trabalhar os conflitos de seus jovens protagonistas ao sentirem-se deslocados dos hábitos de família, seja por suas responsabilidades ou pelos próprios costumes. A deslocada da vez é Mirabel (voz original de Stephanie Beatriz), descendente da família Madrigal que, num momento de grande aflição no passado, recebeu da natureza um encanto para que pudessem sobreviver com habilidades mágicas e retribuindo tal graça alcançada prestando favores para a comunidade que também cresceu entre a família fugitiva. Da matriarca (voz original de María Cecilia Botero) e seus filhos, vieram os netos também com seus dons distintos e não menos que fascinantes –  com exceção de Mirabel, que não entende porque a vela do encanto nada lhe concedeu, para o desagrado de sua abuela Alma.


O quarto do primo Antonio é uma das passagens mais bonitas de todo o filme. (© Disney/Reprodução)


Enquanto Mirabel tenta descobrir as razões por ser tão desencantada a ponto de ser cada vez mais um mau agouro para os Madrigal, a música corre solta pelo filme, para o agrado do público que sentiu falta de cantoria em 
Raya e O Último Dragão, ainda que Encanto compartilhe do tom aventuresco daquele. Além de dar voz ao "sinistro" tio Bruno, o talentosíssimo Lin-Manuel Miranda traz canções emocionantes cujos arranjos instrumentais fogem dos clichês latinos que gringos gostam de ouvir e insere une o trap e o reggaeton às sonoridades mais acústicas com os ritmos deliciosos que o país exportou para o mundo. 

Assim, se o aspecto sonoro já conquista e reforça toda a emoção que faz os nossos olhos marejarem mais de uma vez, a riqueza visual também se dá nas texturas dos ambientes e na composição tão cheia de graça dos animais, na fotografia de cores tão vivas e luzes em noites acalentadoras ou até no uso de um tom de verde para simbolizar o terror, chama a atenção o apreço da equipe de animadores na composição da diversidade da família Madrigal. A começar por Mirabel que foge do fenótipo de princesa (mais inclinado para uma de suas irmãs, Isabela), há um cuidado nas minuciosidades de cada vestimenta, penteados, tipos físicos e, principalmente, os tons de pele que são bonitos de se ver e que, certamente, fará toda a gente colombiana e demais latinos exprimirem sorrisos por tamanha representação.

O contato de Mirabel com seu tio Bruno demonstra a consequência das implicâncias e expectativas familiares sobre os descendentes. (© Disney/Reprodução)


Divertindo por personificar a casita a ponto de a residência dos Madrigal ser um elemento de grande importância emocional para a trama, sobretudo em seu terço final que traz reviravoltas até que perceptíveis, mas que se fazem inesperadas, Encanto é uma bela história que levanta pautas atemporais, sobretudo quando tangem as cobranças familiares. Da lei do retorno à necessidade de compreensão de que
nem tudo deveria ser rosas quando se trata de projetar expectativas nos outros (acarretando sempre na punição destas quando não correspondem à altura), o filme é enfático ao projetar que não há nada mais encantador do que retribuir o amor – e é isso que faz a magia não cessar.




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