Filme japonês indicado ao Oscar de Melhor Documentário traz empecilhos da justiça quando a denúncia recai em pessoas influentes e poderosas.
O documentário Quatro Paredes (Black Box Diaries, em inglês) conta a história de Shiori Ito, uma jornalista japonesa que foi abusada por Noriyuki Yamaguchi, um influente jornalista político e amigo próximo do então primeiro-ministro do Japão, Shinzo Abe.
Decidida a expor sua história, Shiori escreveu um livro relatando o abuso que sofreu e os desafios enfrentados ao longo dos anos. Inicialmente, manteve sua identidade em segredo para evitar ataques, mas optou por se expor publicamente em busca de apoio e justiça.
O documentário desconstrói a visão idealizada do Japão como uma sociedade perfeita, revelando casos de corrupção e impunidade, especialmente quando o objetivo é proteger figuras poderosas em detrimento das vítimas.
Analisar um documentário é, na minha visão, mais complexo do que um filme de ficção. Aqui, temos um tema poderoso, mas que não se traduz em uma estética cinematográfica marcante. A fotografia é pouco expressiva, e o ritmo não instiga o espectador a antecipar os próximos acontecimentos.
A narrativa é convencional e entrega o essencial, mas é importante diferenciar um grande tema de um grande filme. Quando um documentário não apresenta valor estético ou inovação narrativa, ele pode funcionar como jornalismo, mas falhar como cinema.
Ao retratar o próprio caso, Shiori Itô leva a exploração da experiência da vítima a um nível que dificilmente alcançaria se estivesse contando a história de outra pessoa. Isso levanta um questionamento essencial: quais são os limites éticos na exposição de uma vítima de violência sexual? Em determinados momentos, o documentário parece ultrapassar a simples denúncia das injustiças, aproximando-se da exploração da dor e do luto em vida.
As cenas de sofrimento e indignação são inúmeras, o que traz reflexões sobre a ética jornalística desse relato. Por mais que os fatos narrados estejam ligados a eventos mundialmente relevantes, o documentário pode ser questionado como documento histórico, dada a forma como escolhe apresentar essa dor.
Sua maior força, no entanto, está em mostrar — ainda que de maneira sutil — que a punição não apaga a violência, mas que Shiori Itô segue vivendo, sorrindo e convivendo com seus fantasmas e traumas. Acima de tudo, a obra reforça a importância de lutar pelo que é certo.
Confira o trailer em inglês:
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