domingo, 27 de dezembro de 2020

SOUL é o filme que precisávamos – e sabíamos! | CRÍTICA


Ver um filme da Disney·Pixar é sempre aquela coisa: com raras exceções, é certeza absoluta de um entretenimento garantido bonito de se ver e, como se isso não bastasse, é tão emocionante que a gente não tem como não se emocionar ao ponto de ir às lágrimas – e como isso está cada vez mais frequente! Com um título sugestivo o suficiente a reservar mais uma experiência de abalar o coração, Soul se firma como o filme que precisávamos para nos energizar após um ano de severas aflições.

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Sucessor do fantasioso Dois Irmãos e previsto para lançar originalmente nos cinemas na metade de 2020 (até que a pandemia forçou o estúdio a realizar seu lançamento senão via Disney+), Soul nos leva pela primeira vez para uma miscigenada, barulhenta, frenética e ensolarada Nova York pelos traços caprichosos da Pixar para nos guiar pela vida decadente de Joe Gardner (voz original de Jamie Foxx), um pianista de jazz que, na bem da verdade, é professor de música para alunos majoritariamente desinteressados de um colégio de ensino médio. De certa forma, lembra até o Sebastian de La La Land; orgulhoso demais para se sujeitar a um emprego estável, ele sonha e até diz que morreria por uma chance de tocar no Altas Notas, um prestigiado jazz club, com outros músicos de renome. 

(© Walt Disney Studios/GIPHY/Reprodução)

E não é que a oportunidade vem? No entanto, um acidente na rua o leva para bem longe do clube, de NY ou até mesmo da Terra, mas ao Além-Vida ou, mais precisamente, a sua morte. Só que a vontade de viver de pela música soa mais alto e Joe, em meio ao desconhecido com vários Zés/Jerrys (destaque para Alice Braga, que dá voz a um deles) que preparam tantos para a vida e alinham outros chegados na grandiosa escadaria para o que está por vir, precisa driblar as regras transcendentais a fim de chegar a tempo para aquilo que pode ser a fagulha para a sua carreira, contando com o apoio da desinteressada alma 22 (Tina Fey), que está prestes a descobrir o porquê da preciosidade que é viver.

Dirigido e escrito por Pete Docter, que vem nos tocando com esses temas sensíveis desde UP: Altas Aventuras e nos arrebatou com Divertida Mente, a princípio, parecia que Soul se inclinaria a uma versão etérea da temática do filme de 2015, mas, apesar de trazer um ou outro conceito de religiões espiritualistas, o longa prioriza na conexão com o próximo para, então, estimular a compreensão do nosso propósito individual perante a coletividade, logo em tempos nos quais as pessoas ficam reclusas diante de telas aguardando por aceitação.

Tina Fey e Jamie Foxx em SOUL
(© Walt Disney Studios/GIPHY/Reprodução)

Dessa aventura que percorre os campos pueris do Pré-Vida a praticamente todos os tipos de recintos urbanos e tumultuados de Nova York, os artistas visuais da Pixar se superam mais uma vez nos detalhes das texturas dos ambientes e no acabamento dos personagens que vai além do progresso visto em Toy Story 4, se dedicando não só a cortes de cabelo, mas nas expressões faciais que superam a covinha na bochecha de Miguel em Coco. São os poros no rosto, a luz de holofotes refletida nas gotas de suor de uma saxofonista, as rugas nos lábios com batom de uma mãe que não esconde o pesar de o filho trilhar um caminho que já fora suficientemente difícil para o pai. Se Soul é sobre a vida, nada mais digno do que enaltecer esses pontos corriqueiros que só enriquecem a experiência visual.

(© Walt Disney Studios/GIPHY/Reprodução)

Com Trent Reznor e Atticus Ross (Mank, série Watchmen, A Rede Social) surpreendendo em compor uma trilha sonora amistosa e efusiva em parceria com Jon Batiste, o maior aprendizado que recebemos com Soul é aquele que sempre soubemos: não desistir apesar de todas as adversidades e deixar as pessoas falarem para que possamos nos entender melhor. Porque são nesses momentos até mesmo banais, de um papo furado de homens na barbearia a uma epifania de um improviso no piano, que podemos encontrar fagulhas o suficiente para querer viver mais e mais.



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