Em Divórcio (Pedro Amorim, 2017), Júlio (Murilo Benício) interrompe o casamento arranjado de Noeli (Camila Morgado), ele não tem muito o que oferecer além de seu amor, e ela aceita partir com ele, a despeito da benção da família. Vinte anos depois, após criarem uma bem sucedida fábrica de molho de tomate, e viverem uma vida abastada, ela se entedia e passa a observar os defeitos do marido. A gota d'água acontece quando, após pegar um malfadado atalho, o carro pifa e ele precisa voltar para casa para buscar ajuda, mas a esquece. Ela volta no dia seguinte, depois de andar quilômetros e sobreviver a uma onça e pede o divórcio. Isso leva os dois a buscarem pelos melhores advogados do ramo, que os instruem a ser inescrupulosos na partilha de bens, o que leva a uma verdadeira guerra dos sexos, escalando a níveis de ação intensa.
O divórcio é aqui um ponto nevrálgico de uma relação esgotada pelo tempo e insatisfeita pelo conforto dos bens materiais, que implica numa trama de renovação dos laços matrimonias e de busca de seu fundamento primordial: o amor. Camila Morgado faz um sotaque interiorano que balanceia entre o cômico e o natural e o mais interessante na interpretação de Murilo Benício é uma risada peculiar – e que é execrada pela protagonista, além de ser engraçada por si só, também dá ao ator uma fisionomia diferente. Alguns diálogos forçados de gênero, sobre a importância do amor, são tão deslocados, que lhe conferem uma expressão de pedra – que poderia ser mais interessante caso o filme se propusesse doses maiores de escracho, o que não é o caso, já que ele é mais pé no chão, é mais realista. Mas conforme o filme ganha ritmo e humor, sua atuação se prova mais do que adequada.
O filme surpreende pelo ritmo compassado, em sua maioria evitando diálogos expositivos, e pelas piadas que encerram as cenas, mas o estilo de direção é protocolar, em essência televisivo, planos de contextualização para iniciar a cena ou um plano geral do ambiente, seguido por campos e contracampos de closes ou planos médios, com pouco espaço para planos de duração maior. Porém, dois momentos em particular revelam possibilidades cinematográficas latentes: em um open bar de música sertaneja, Júlio flagra Noeli sendo paquerada por um cantor de música sertaneja. Enciumado, ele se levanta de um sofá e se posiciona à frente de uma cabeça de touro empalhada, fazendo com que os chifres lhe decorem a cabeça. Um comentário visual que ressalta a traição que está vivenciando. Numa sessão de tiro, para acertar o alvo, Noeli é orientada a se concentrar em uma pessoa que ela odeie muito, e em seguida o alvo se materializa no rosto de Júlio com sua peculiar risada. Dois recursos visuais que enriquecem a representação e adicionam humor visual ao filme.
O maior ponto negativo do filme é a falta de inventividade visual, mas se o cinema comercial brasileiro seguir esta linha, poderá superar vários estigmas e se afastar da pecha de execrável.
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