É curioso pensar como o título e até mesmo a filmografia do protagonista de O Agente Secreto nos levam a crer que os 160 minutos de filme se tratam de uma narrativa de espionagem, mas há muito mais nas entrelinhas do novo longa assinado por Kleber Mendonça Filho (Retratos Fantasmas, Bacurau, Aquarius). Enquanto resgata uma carnavalesca Recife da década de 1970, a trama nos prepara sobre um ensaio digressivo sobre heranças e resistências de diversas formas.
O inimigo agora é outro – e Wagner Moura aqui não é um Capitão Nascimento nem Pablo Escobar ou qualquer personagem prévio de grande poder. Em uma faceta muito admirável (e com surpresas), o ator entrega um homem resoluto em tentar ser um pai presente, um filho persistente em encontrar o registro da mãe e, quem diria, um pesquisador que bate de frente pelo futuro do Brasil a partir da ciência. Sim, o título do filme pode ser até uma homenagem a um longa homônimo projetado durante uma cena importante numa sala de cinema, mas vem a enaltecer todos aqueles que estiveram em ação a favor do desenvolvimento e tiveram que pagar caro por conta de conspiracionismos alheios e, por vezes, em cargos superiores.
Com destaque às atuações radiantes de Tânia Mara, Maria Fernanda Cândido e Roney Villela, além das elipses temporais bastante inteligentes (um recorte de jornal nos impacta até mais do que se o incidente fosse encenado como esperado), O Agente Secreto pode parecer extenso, porém, sua divisão em três capítulos torna a projeção em uma imersão narrativa sem escapatórias, vide o trabalho redobrado da produção ao caprichar nos mínimos detalhes dessa viagem temporal. Em conversa pessoal com Fellipe Fernandes (Rio Doce), 1º assistente de direção em O Agente Secreto, soube que era de predileção de Kleber em evitar planos mais fechados por ser uma solução comum em filmes de época, valendo todo o esforço de reconstituição que vão além de meros adereços.
No fim das contas, o que está no filme também é sobre o receio de não ser esquecido, de ser tratado como indigente e de perder o que mais nos define – daí a importância do nosso cinema ser tão plural e pujante em mostrar a cara.

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