Há quem tenha visto em Coringa (passada toda a euforia super-heróica de Vingadores: Ultimato em contraste com os solavancos dos filmes da DC) uma verdadeira iguaria ao acompanhar uma narrativa melancólica carregada pela performance soberba de Joaquin Phoenix como um dos vilões mais ardilosos da cultura pop em seu retrato muito do patológico. Para tantas possibilidades de sequência (considerando sua fonte riquíssima de histórias) mediante o sucesso de público, crítica e premiações, é uma pena que o oportunismo e a petulância do diretor Todd Phillips pesem ainda mais e conduzam Coringa: Delírio a Dois a uma jornada entediante e reticente em assumir as suas pretensas roupagens.
(© Warner Bros. Entertainment/Divulgação) |
Por mais que seja interessante ver o comportamento de Fleck em cárcere e, daí, a sua proximidade crescente com Lee (Gaga) e as performances inflamadas diante do júri, volta o vício irritante de Phillips em querer sugerir que uma ou outra sequência em questão possa ser apenas um devaneio do protagonista sem ao menos propor algo genuinamente novo ao personagem. Ao longo da sessão, inclusive, fiquei imaginando que seria ali na prisão que este Coringa passaria a construir boas piadas (a escalação de Brendan Gleeson era um indicativo) e/ou começar a sua escalada como estrategista do crime como era de se esperar.
(© Warner Bros. Entertainment/Divulgação) |
Muito pelo contrário. O vilão entra mudo, fala um pouco, dá as risadas, canta e segue calado, como se consciente da repercussão duvidosa que o primeiro filme levantou entre um público reacionário que, paralelamente, segue idolatrando figuras políticas da mesma estirpe (ou pior?). Em um provável mea culpa, Phillips parece evitar que o personagem seja consagrado como um "agente do caos" e, assim, inflamar um cenário que já está em meio a pólvora.
Há bem menos Harley Quinn do que gostaríamos de ver. (© Warner Bros. Entertainment/Divulgação) |
Até os números musicais, que tinham tudo pra ser o chamariz da obra como anunciado, se tornam supérfluos em meio a narrativa conflituosa. Inicialmente compreensíveis em meio a diálogos, assim reforçando a química muito boa de Phoenix com Gaga com canções românticas, são as cenas cantadas em cenários coloridos e de tonalidade alegre que não parecem fazer sentido algum logo por serem tão idênticas e incongruentes com o restante da narrativa. É também o momento em que Lady Gaga deixa o pouco que tem de Harley no roteiro e volta a ser a cantora performática que já conhecemos.
Dinâmica entre Lady Gaga e Joaquin Phoenix é um dos pontos altos do filme. (© Warner Bros. Entertaiment/Divulgação) |
Não que Coringa: Delírio a Dois (Joker: Folie à Deux, no original) tenha que ser assistido com a menor das expectativas ou que o longa deveria se inclinar mais para a ação e, assim, ser mais fiel ao seu material dos quadrinhos (o que é uma crença ridícula, ainda mais estando no final de 2024). Ao escamotear potenciais possibilidades de desenvolvimento de seus personagens e de, ainda, jogar o selo da DC Comics para o fim dos créditos, a impressão que fica é que Todd Phillips apenas tirou vantagem de uma tendência e ludibriou o público (sempre sedento por referências – e tem algumas – ou por, no mínimo, um bom filme com seu diferencial) em proveito próprio.
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