quarta-feira, 16 de fevereiro de 2022

LICORICE PIZZA – despretensão apaixonante | CRÍTICA


Paul Thomas Anderson
apresenta um retrato de como é bom ser jovem com uma certa dose de nostalgia de viver nos anos 70 e de se apaixonar pela primeira vez. Em meio a isso, ele entrega um filme brilhante tecnicamente e consolida ainda mais seu nome como um dos melhores diretores da atualidade.

Paul Thomas Anderson (ou só PTA) é um dos mais cultuados diretores da chamada “geração de 90”, que revelou ao mundo uma série de diretores que dominariam a indústria quase duas décadas depois. Dentre eles, estão nomes como Quentin Tarantino (Pulp Fiction), David Fincher (Clube da Luta), Christopher Nolan (A Origem) e Wes Anderson (O Grande Hotel Budapeste). Diretores com forte veia autoral e que se destacaram na transição pré-digital e encabeçam a lista de qualquer tópico sobre o tema “película x digital”. Anderson está do lado da película, com uma particularidade sobre seus dois últimos trabalhos – além de diretor, ele exerceu o papel de diretor de fotografia com o estreante na função Michael Bauman.

O título, que até setembro do ano passado era Soggy Bottom, se tornou Licorice Pizza (pizza de alcaçuz, em tradução livre), justamente para lembrar uma icônica loja de discos localizada no sul da Califórnia nos anos 70. Isso já diz muito sobre o que é o filme: uma reconstrução de um momento histórico na vida do diretor. O nome "soggy bottom" ainda está inserido no filme.

O filme conta a história dos jovens Alana Kane (a cantora estreante Alana Haim) e Gary Valentine (o estreante Cooper Hoffman, filho de Phillip Seymour Hoffman) que vivem a juventude no Vale de San Fernando, em 1973. Os dois iniciam vários negócios, flertam, fingem que não se importam um com o outro e, inevitavelmente, se apaixonam por outras pessoas para evitar se apaixonar um pelo outro. Mas há um problema efêmero para a juventude: uma grande diferença de idade, ela tem 25 e ele, 15.

(© Universal Pictures/Divulgação)

Antes de tudo, Licorice Pizza é um filme despretensioso, que não quer contar uma história revolucionária, cheia de reviravoltas, mas sim transmitir uma ideia de como era ser jovem nos anos 70 e a sensação de se apaixonar pela primeira vez. Claro que aqui entram vários pequenos plots que vão desde uma empresa de colchões de água até a crise do petróleo de 1973, originada por questões políticas.

A relação dos dois sempre é cercada de inseguranças dela sobre o que os outros vão pensar de uma mulher namorar um garoto, já Gary, um adolescente cheio de confiança é o oposto completo, jamais se importa com a opinião alheia e busca extravasar sua juventude nos negócios. Na busca por se afirmar, Alana sente que precisa da aprovação dos mais velhos, de fazer algo nobre e ser reconhecida entre seus pares, porém sente que a busca é vazia toda vez que cai de cabeça em um projeto e se decepciona com os outros homens.

O filme é ensolarado, com uma energia boa, que em momento algum te deixa para baixo e é justamente nesse clima que ele encontra sua maior virtude, a sensação de querer ser um adolescente no Vale de São Fernando. Ao usar os anos 70 de pano de fundo, Paul Thomas Anderson uma trilha sonora simplesmente fenomenal, com nomes como Nina Simone, Cher, Paul McCartney, David Bowie, The Doors entre outros, sempre de maneira primordial e conversando com o filme.

(© Universal Pictures/Divulgação)

Além do casal protagonista, o elenco é recheado de atores incríveis, como Sean Penn, Tom Waits e Bradley Cooper completamente maluco. Esses papéis funcionam como pequenos capítulos frente a um grande livro de contos que se torna o filme ao longo das pouco mais de duas horas que passam voando.

Há um elemento no filme que chama a atenção, que são as repetidas vezes que Gary corre. Se vemos um adulto correndo é de desespero, atraso, mas Gary não, ele é um adolescente, corre para tudo, sem pretensão ou pressão de ser julgado por apenas correr. Ao passar da trama, Alana se vê correndo de alegria, em busca de algo que faça sentido para ela, uma pessoa sem nenhuma perspectiva. 

Se pode haver alguma crítica negativa, talvez por algumas cenas de um personagem xenofóbico que podem ser interpretadas como discurso do filme. Outro fator é que o filme não tem história, sendo que a proposta é justamente um estudo de personagens e de uma época específica, não focando em um roteiro complexo.

As crônicas de adolescente criadas por Paul Thomas Anderson tomam forma de maneira viva, saturada, de bochechas vermelhas, espinha na cara e muita tensão sexual reprimida. Poucos filmes tem um clima tão bom a ponto de fazer com que o público queira ser tele transportado para dentro da tela e viva um amor passageiro de verão, tão importante quanto todas as outras coisas desimportantes da vida de um adolescente. Talvez a coragem unida a um pouquinho de arrogância, típicos de quem ainda é jovem demais para entender que não sabe nada, sejam os ingredientes que tornam Licorice Pizza tão gostoso.

Como é bom ver um filme despretensioso tão bem feito!




Licorice Pizza foi indicado a três Oscars: Melhor Filme, Diretor e Roteiro Original. 

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