domingo, 4 de dezembro de 2016

É Apenas o Fim do Mundo | CRÍTICA


Vencedor do Grande Prêmio do Júri no 69º Festival de Cannes ao lado do inédito romeno Baccalauréat, de Cristian Mungiu, É Apenas o Fim do Mundo (Juste la Fin du Monde, no original) é o último filme de Xavier Dolan, o jovem e egocêntrico diretor canadense que tem marcado presença nos festivais internacionais desde 2009, quando tinha apenas vinte anos. O sexto filme do diretor, entretanto, revela que o aparente amadurecimento observado em Mommy (2014) ainda é arriscadamente instável ao apresentar certo esvaziamento dramático, bem como uma overdose histérica que põe em cheque a própria linguagem cinematográfica enquanto se detém ao texto da peça homônima de Jean-Luc Lagarce, mote do filme.

Louis (Gaspard Ulliel) é um escritor que, ao descobrir uma doença fatal, volta para casa a fim de contar à mãe e aos irmãos sobre sua morte iminente depois de amargurados doze anos distante. Investindo em problemas familiares que refletem ecos de si mesmo, o foco da história é o ressentimento, a antipatia e a incomunicabilidade domésticas. A mãe Martine (Nathalie Baye), os irmãos Suzanne (Léa Seydoux) e Antoine (Vincent Cassel) e a mulher deste, Catherine (Marion Cotillard), esperam por Louis numa ampla casa burguesa, onde o iminente clima de festa é substituído prontamente por discussões coléricas e gratuitas, do grande almoço de boas-vindas até a despedida repentina.


Apesar de tantos bons atores, as personagens do filme só existem funcionalmente, trajando-se de comportamentos exclusivos e se detendo piamente a cada um deles até o fim da trama. Não há dúvidas, por exemplo, de que Antoine encarna a incompreensão revoltada; é um personagem categoricamente linear. A propósito, essa espécie de categorização funcional perpassa a obra como um todo ao direcionar a linguagem audiovisual às preferências do diretor aparentemente por puro estilo. A montagem muitas vezes vídeo-clipada acompanhando músicas pop, a histeria neurótica e os contrastes barrocos (causados, aqui, principalmente pelas propositais amálgamas trilha musical-imagem visual) característicos de Dolan estão tão exageradamente presentes que chegam a alcançar o título de excessos artísticos.


É Apenas o Fim do Mundo, enfim, é um filme que se pretende corrosivamente acre, mas ao se prender à subjetividade das personagens, a um mundo mais interno e, a priori, nada audiovisual em si, perde dramaticidade. A rasa profundidade de campo ou mesmo o desfoque total corroboram essa pretensa imersão psicológica, dificultando a identificação do que de fato é dramático ou exagerado pela falta da manipulação temporal tarkovskiano e do aproveitamento desajeitado da semiótica audiovisual. Trata-se de uma potencial e tocante história doméstica sobre as relações humanas prejudicada pelo egocentrismo de um artista requintado e, de certo modo, prematuro. Um filme de rostos, e não de espaços; claustrofóbico.




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