segunda-feira, 6 de dezembro de 2021

AMOR, SUBLIME AMOR – o esmero de Spielberg no resgate de identidades | CRÍTICA


Há quem se incomode com o tique hollywoodiano em fazer continuações, remakes ou reboots mais visando o lucro do que um talvez nobre propósito de reapresentar tal conto para novas gerações com melhores recursos técnicos. Era quase inimaginável também pensar que um cineasta como Steven Spielberg teria a audácia de tocar num título tão estimado como o oscarizado musical Amor, Sublime Amor logo quando o diretor sempre parece pensar à frente mesmo com as tramas de época que ficou acostumado a fazer.


O West Side Story (título original) de Spielberg tem muito a mostrar e a dizer, sobretudo quanto a definição da identidade americana a partir do que os estrangeiros contribuem para o país. Analisando alguns aspectos cinematográficos antes, o traço autoral do diretor é evidente logo na sequência inicial: são constantes os seus planos longos de movimentações de câmera estonteantes e com a gradação de cores do diretor de fotografia Janusz Kaminski puxando pra um melancólico tom de azul a refletir nas vestimentas do proletariado irlandês da Nova York do final dos anos 1950, em contraste com o vapor das luzes neon dos letreiros nas noites em que os imigrantes portorriquenhos se dão o direito de bailar e cantar com suas vestes alegres. 

À parte do design de produção impecável expandindo cenários para uma escala épica crível, que agora retrata um tempo não mais contemporâneo (ainda que tópicos como preconceito e especulação imobiliária se mantêm vigentes), ainda paira a dúvida: o que tanto muda entre as versões que encenam as acirradas rinhas entre Sharks e Jets?

(© 20th Century Studios/Reprodução)

Da reordenação de algumas músicas (agora captadas e ouvidas em toda a sua glória) e o grude permanente deixado pela performance radiante de "America", da coreografia com seus gestos e saltos icônicos, sem se esquecer do retorno de Rita Moreno com uma nova personagem, fica mais do que evidente o cuidado exímio da produção no retrato dos personagens portorriquenhos, algo tão contestado no original de 1961 a julgar pelas maquiagens grosseiras aplicadas num elenco quase todo caucasiano. Dos destaques dessa nova roupagem, Ariana DeBose (Hamilton) faz de Anita uma mulher forte à frente do seu tempo, o que não quer dizer que seja menos apaixonada por Bernardo (David Alvarez) e toda a rapaziada rival apresenta tipos físicos diferentes – um alívio, se for considerar os fenótipos atléticos que os teen movies empurraram por todo esse tempo. 


(© 20th Century Studios/Reprodução)

Falar de Amor, Sublime Amor se esquecendo de Tony e Maria seria ultraje, ainda mais que essa relação tende a ser o nosso elo emocional com a trama, agora amplificado pelo roteiro de Tony Kushner (Lincoln). Ansel Elgort concede ao rapaz o jeito galante que se divide com a hesitação de seguir à risca as imposições de sua condicional ou se arriscar no amor dito proibido que vai nutrindo pela chica portorriquenha. De fato, a meiguice da estreante Rachel Zegler conquista nossos olhos e ouvidos logo em seus primeiros minutos de tela e admira a maturidade com que a atriz encara o papel e seu ótimo alcance de voz não compromete em nada o seu protagonismo.

Valentina (Rita Moreno) é mais do que uma participação especial no filme. (© 20th Century Studios/Divulgação)

Para alguém, como eu, que ficou a ver o original de 1961 e nem leu o livro da peça original de Arthur Laurents, penso que esse novo Amor, Sublime Amor não só respeita o legado artístico da obra e as músicas de Leonard Bernstein e Stephen Sondheim com afinco e esmero (Spielberg dedica o filme ao pai, que teria lhe presenteado com um vinil do musical), mas resgata todo um charme cinematográfico que vai além das possibilidades alcançadas com uma lente anamórfica como faziam na produção do gênero naqueles idos – mesmo se tratando de um enredo urbano, ver um rapaz cantando apaixonado sobre uma poça num beco mal iluminado nunca fora tão mágico! 


Se a duração extensa pode soar cansativa, de qualquer forma, é válido honrar o que Spielberg, equipe e elenco fazem nesta nova versão. Um retrato composto de povos que sempre foram cruciais para o progresso estadunidense, mas que agora permite à essência da narrativa um lugar de fala que, no passado, teria que ficar relegado às ambiguidades e entrelinhas. Entre realidades sobre o tratamento da polícia a latinos e pretos (crueldade mencionada, ao invés de encenada), da vontade de ser patroa de si mesma ao desejo de ser um rapaz de gangue, eis uma tragédia de sonhos, lutas, fugas e – por que não? – um digno reconhecimento.



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Um comentário:

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