Uma experiência musical em teatro adaptando uma das novelas mais célebres de Clarice Lispector me fez ter pouquíssima afinidade com A Hora da Estrela, embora era de meu conhecimento a premiada versão cinematográfica lançada em 1985 dirigida por Suzana Amaral, o que me aguçou a curiosidade em tanto ler a obra original quando apreciar o filme – muito que para saber por que toda aquela desgraceira em palco merecia os aplausos de longos minutos tipo Festival de Cannes. Agora, recebendo uma ótima restauração e regressando aos cinemas quase 4 décadas depois pelo (sempre bem-vindo) programa Sessão Vitrine Petrobras, o icônico filme mostra às novas gerações o quão inteligente nosso cinema sempre foi.
(Foto: Vitrine Filmes/Divulgação) |
O resultado, porém, é adverso: suas colegas de quarto estranham seu cheiro e hábitos, seu serviço de datilógrafa é desleixado e os encontros com Olímpico (José Dumont) só servem para postergar a sua esperança enquanto o metalúrgico parece sentir prazer em desprezar sua aparência e personalidade. Isso sem contar o preconceito por ser nortista. Macabéa parece ser alheia às crueldades que a circundam, ainda mais quando seus desejos passam a se externar cada vez mais.
Nisso, a decupagem de Suzana Amaral é exímia em utilizar planos de detalhes e movimentos de zoom pra reforçar o êxtase da protagonista em uma representação de fetiches que a montagem paralela só tende a potencializar o efeito. A sequência da leitura das cartas de tarô por uma Fernanda Montenegro toda mística é um show à parte!
(Foto: Vitrine Filmes/Divulgação) |
Fruto de uma época tão transitória para o Brasil e importante exemplar do olhar feminino na direção, A Hora da Estrela não poderia ser mais emblemático: uma corrida em uma lufada de liberdade após tantas maldades sem temer o que haveria por vir.
P.S.: sobre a remasterização 4K, penso que o trabalho de imagem foi muito satisfatório, embora a faixa de áudio tenha mantido alguns ruídos do som original.
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