quinta-feira, 10 de março de 2022

BELFAST – frieza com os olhos de uma criança | CRÍTICA


Belfast tenta emular um filme de memórias e acaba esbarrando em um Oscar-bait dos mais simples e óbvios da temporada. Ao entrar nesse filme, percebe-se de longe a pretensão para prêmios acima de querer contar uma boa história.

Na Irlanda do Norte dos anos 60, Buddy (Jude Hill), um menino de 9 anos, experimenta o amor, a alegria e a perda. Em meio a conflitos políticos e sociais na capital do país, o garoto vive em uma comunidade cercada e ouve os conselhos dos avós (Ciarán Hinds e Judi Dench) e os cuidados da mãe (Caitriona Balfe) para buscar esperanças de um futuro melhor.

Em Belfast, temos uma narrativa baseada em um arquétipo que tem se tornado cada vez mais comum: a visão de uma criança para conflitos complexos e que marcaram a história (Jojo Rabbit e O ano em que meus pais saíram de férias são exemplos dessa linguagem). O problema presente nessa abordagem é a possibilidade de amenizar conflitos e "passar pano" para figuras execráveis da história, ou a diminuição do real impacto das ações – e é justamente isso que acontece em Belfast. A guerra civil da Irlanda do Norte marcou uma ferida profunda no país, mas aqui parece ter sido uma meia dúzia de arruaceiros que não gostavam muito de vidraças. 

A retratação com frieza que o diretor Kenneth Branagh (Morte no Nilo) conduz o longa talvez seja o ponto mais baixo do filme, pois se o diretor não consegue construir empatia nem sobre uma família que sofre ataques, quem mais pode ser alvo de nossa compaixão? Não há a menor vontade de saber mais sobre o irmão de Buddy ou mesmo sobre qualquer outro personagem além de seu avô, que convenhamos quase todo mundo tem uma empatia natural. Aqui o senso de urgência nunca é tão bem explorado, pois a família apresenta possibilidades de sair do conflito em vários momentos.



A fotografia em preto e branco é seca, sem textura e a jogada espertinha de adicionar cor em alguns momentos é tão boba que chega a ser cômica. O contra-plongeé usado em excesso para simular a visão de uma criança é coisa que um calouro de cinema acharia genial, mas, para um indicado ao Oscar, é bem básico.

Outro ponto que baixa muito a qualidade do filme é a péssima montagem, que reúne um dos piores timings cômicos que me lembro nos últimos tempos, a um nível quase constrangedor, do filme parar para esperar uma risada da plateia e o cinema permanecer em silêncio. Além disso, a ação de movimentos também é prejudicada pela montagem capenga, pois nunca parece que realmente algo ali é palpável. O filme ainda tem uma das piores cenas de soco que já vi na vida, talvez pior que as atuações teatrais mais exageradas.


Belfast até poderia passar incólume se não fosse tão pretensioso, com uma ideia de que quer a todo momento participar da temporada de premiações. Basicamente imagine um filme Oscar-bait, ele terá uma recriação de época de guerra, com uma fotografia monocromática e um roteiro de drama familiar básico, isso é Belfast, nada mais que isso, então soa até estranho que ele seja um dos principais concorrentes de Ataque dos Cães. Eu até poderia deixar passar a canção original do filme ser interpretada por Van Morrison, mas um anti-vacina ser indicado ao Oscar nos dias de hoje é descuido demais da produção.


Belfast, enfim, é um filme que encontra vários paralelos com o padrão de memórias de um diretor, a diferença é que Branagh não é nem perto um Alfonso Cuarón, mas apenas um diretor mediano.





Belfast foi indicado a 8 Oscars: Melhor Filme, Melhor Direção, Melhor Atriz Coadjuvante, Melhor Ator Coadjuvante, Melhor Roteiro Original, Melhor Som e Canção Original.


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